26 de julho de 2008

Sou anti-ecológico

Ser-se anti-ecológico nos dias que correm é um acto de pura loucura, diriam uns. Um suicídio mesmo, acrescentariam outros. Mas ser-se ecológico é como ser-se uma ovelha num rebanho tão grande e histérico, como estúpido. Por isso, convictamente, e contando já com os pequenos e grandes percalços, prefiro a primeira hipótese.

Dito isto, se calhar corro o risco de ser morto na rua da próxima vez que sair de casa, de ser excomungado da APAP (Associação Portuguesa de Arquitectos Paisagistas), à qual também nunca pertenci, ou mesmo até nunca poder vir a concorrer para um lugar político, o que até, bem vistas as coisas, é um favor que me faziam.

Ou então simplesmente corro o risco de não lerem este texto até ao fim. Porventura será até melhor.

O que significa ser anti-ecológico? Basicamente é tudo aquilo que um ecológico não é, ou seja, uma pessoa que admite que aquilo que se vive hoje em dia neste mundo, há muito que ultrapassou todos os limites do aceitável, do credível, e até do saudável. Visto de fora, digamos de um qualquer planeta com vida, a Terra pode ser considerada como o planeta eco-fanatico, completamente alheio à poeira que lhe é atirada para os olhos.

Tenho vindo lentamente a tornar-me anti-ecológico mesmo sem me aperceber disso, mas a convicção surgiu-me há uns dias, depois de ter visto um artigo sobre um resort ecológico que propõe tão simplesmente a construção de centenas de casas-cogumelos, num lugar que é hoje é um mata atlântica. Yupi!!!! Vamos todos mas é ser ecológicos e comprar uma casa ecológica neste fabuloso éden cheio de asfalto e vizinhos igualmente parvos! O episódio é no entanto irrelevante perante a diarreia geral que é o movimento em defesa do ambiente.

Não há precedentes de uma histeria colectiva como esta do ser-se ecológico, levemente comparável apenas ao fenómeno que o uso da palavra radical atingiu, associada a tudo o que era destinado a massa teenager do anos 90 (nunca cheguei a entender ao certo o conceito de pastilha elástica de sabor "banana radical". O que é uma banana radical?). Também podemos compará-lo ao de leve com as propriedades mágicas atribuídas à gosma do Aloe vera em tudo o que poisa - iogurtes, detergentes, champôs, tisanas, sumos, cremes, anti-depressivos, anti-cancerígenos, cura contra a obstipaçõa, lesões, e questiono-me sobre possível sabores em preservativos).

Mas porque é que eu tenho de acordar com a fronha do Leonardo di Caprio a dizer umas obtusidades algorianas sobre temas que lhe são completamente abstractos? Ou de saber que o actor Christian Bale é vegetariano (mas será que não têm nada de melhor a dizer sobre a carreira do senhor? E desde quando é que ser vegetariano é ser ecológico?) Ou ainda que o Chris Martin é considerado um dos vegetarianos mais sensuais do mundo?

Há uns dias googlei sobre as pessoas mais influentes do mundo na área da protecção ambiental e ecológica. Deparei-me com uma lista intitulada "Top 10 Green Celebrities", assim constituída:

1. Al Gore
2. Leonardo di Caprio
3. Natalie Portman
4. Brad Pitt
5. Ed Begley, Jr. (quem souber quem é o senhor explique por favor)
6. Hayden Panettiere
7. Scarlett Johansson
8. Chris Martin
9. Heather Mills
10. Tobey Maguire

Primeira pergunta que me ocorreu: Será que isto é a gozar? Resposta: Parece que não, já que a lista está publicada por tudo o lado, soando a coisa vagamente importante.

Segunda pergunta: Será que isto é a gozar? Não queria acreditar mesmo. Mas onde estão nome como Wangari Maathai, Rachel Carson, ou Farley Mowat?

Eu compreendo que não se saiba quem são. Compreendo até porque as duas primeiras senhoras não entraram em nenhum filme intergaláctico, de carros ou de artilharia pesada, com um peito postiço e um decote até ao umbigo. O último não se conhece, porque realmete o que interessa saber quem é um senhor barbudo e fora de moda que nem sequer um blazer Armani põe sobre o pêlo para receber um prémio hediondo?

Mas podemos ficar todos a saber que Wangari Maathai é uma queniana, activista ambiental promotora do desenvolvimento sustentável no continente Africano e ap rimeira mulher africana a receber o Prémio Nobel da Paz. Ou que Rachel Carson, nascida há mais de 100 anos, foi a responsável pelo nascimento da actual consciência ecológica e ambiental, enfrentando o poderosíssimo lobby americano das empresas produtoras de pesticidas, no rescaldo da Segunda Guerra Mundial. Ou ainda que Farley Mowat é um ícone da defesa ambiental, cujo trabalho tem influenciado milhões de pessoas na defesa daquilo em que acreditam.

Estou farto dos Rock in Rios a favor da defesa do mundo, ou de saber que a Camilla Parker Bowles celebrou o seu sexagésimo primeiro aniversário num jardim orgânico, ou dos construtores civis que usam a etiqueta da sustentabilidade para limpar as consciências dos crimes que insistem em cometer. E se este artigo estiver a parecer o fruto de um frustrado que apenas quer lamentar a sua vida angustiada, fique sabendo que está perto da verdade. Mas antes de a descobrir por completo, dê só uma espreitadela ao monumento à ecologia que é o Ecorazzi.

Posto isto, só me apetece cuspir em todas as empresas que se fazem passar por eco-friendly, atirar papéis para o chão, armar-me em rebelde e não separar os lixos e contribuir ainda mais para o derretimento das calotes polares.

Mas não o farei. Porque sou anti-ecológico.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tiago, maravilhosa diarreia sobre a folha eco-verde dos pacotinhos e embalagens de tudo e mais alguma coisa!!!!

excelente valsa com os conceitos semi conhecidos por todos mas bem explorados e altamente em voga nos dias de hoje.

Mudaste a minha manhã de segunda feira!

João primo

TTC disse...

;) Gosto de ver os teus comentários por estas bandas. Principalmente quando acrescentam mais qualquer coisa!