27 de agosto de 2008

Para o infinito...e mais além

Os Jogos Olímpicos (JO) acabaram. Como tudo o que é bom de resto. Por isso porquê falar deles agora, justamente no fim?

Poderia falar das controvérsias da cerimónia de abertura (sim, foram manipuladas parcialmente em computador), ou da colocação do relvado no Ninho de Pássaro (sim, foi colocado em menos de 48 horas), ou mesmo do magnífico edifício da piscina (sim, António, é mesmo magnífico, e tem uma estrutura capaz de controlar mais eificazmente as características termodinâmicas e vibratórias da água). Poderia até dizer que este foi um dos mais bem sucedidos acontecimentos desportivos olímpicos de sempre, quer em termos de preparação, quer em termos dos recordes batidos, ou mesmo do espírito desportivo.


O fim dos JO torna mais pertinente falar do que acontecerá depois. Bem, imediatamente depois teremos os Jogos Paralímpicos, que decorrem entre 6 e 17 de Setembro. Mas….e depois disso?

Li há uns dias que uma das principais razões pelas quais as cidades competem tão selvaticamente entre si pelos JO é a oportunidade de remodelarem totalmente as suas infra-estruturas, assim como a sua imagem global. De um modo geral, essa reestruturação urbana da cidade anfitriã é sempre feita. No caso actual, Pequim pareceu determinado em fazer isso, não só na cidade, como no país inteiro.

O principal objectivo destas grandes mudanças extravasa naturalmente as duas semanas em que duram as competições. Por isso, quando se trata de avaliar o seu sucesso em termos urbanísticos, o maior triunfo reside, quanto a mim, na capacidade de integrar o novo tecido na malha urbana já existente. Isto é determinante na actualização do carácter de uma cidade, sem contudo destruir a sua alma. Por isso, e do ponto de vista urbano, os jogos ainda agora começaram.

Para já não estamos em condições de avaliar esse sucesso em Pequim, mas apenas a constatar que o plano foi, nalguns aspectos, feito de forma inteligente. Que o digam as universidades que vão beneficiar de novas instalações desportivas. A tentação de criar grandes complexos desportivos pós-olímpicos (como o caso de Barcelona) é enorme e quase sempre, desastrosa. Os chineses determinaram, e bem, que cada pavilhão passasse a ser administrado por uma universidade. Com isto conseguem não só garantir o seu uso, como também os custos na sua manutenção.

Mas nem tudo são vantagens. O governo chinês admitiu já a catástrofe em que se está a tornar Pequim, pelo aumento significativo do trânsito, da poluição ou pela destruição quase completa dos hutongs, os bairros típicos (a uma velocidade de 600 bairros por ano).
A outra coisa que podemos fazer a esta altura do campeonato, é comparar este caso com o que foi acontecendo às ex-cidades olímpicas.

Sarajevo, cidade anfitriã dos JO de Inverno – 1984, está praticamente esquecida desse glamour antigo, resultado sobretudo da destruição e dificuldades económicas da guerra civil bósnia. Os campos desportivos foram transformados em campos de batalha e campos de refugiados.


Atlanta albergou os JO em 1996, depois de um boom na construção, sentido desde 1990. Muitas estruturas desportivas eram temporárias, algumas foram reaproveitadas por campus universitários como pavilhões ou estádios, como o da Universidade de Georgia, ¾ do Estádio Olímpico foram deitados abaixo para se tornarem a nova casa dos Atlanta Braves, e apenas a Chama Olímpica permanece intacta, perto do Aeroporto de Hartsfield, como um monumento à história que mudou para sempre aquela cidade.


Atenas teve não só a capacidade de ser duas vezes a anfitriã olímpica nos JO modernos (1896 e 2004), como de utilizar, dessas duas vezes, o mesmo estádio, o Panathinaiko. O estádio foi desde então usado para muitos acontecimentos, e aproveitado pela FIFA, enquanto estádio de Futebol.


A cidade de Moscovo (JO 1980) constitui uma das grandes decepções dos últimos acontecimentos olímpicos do séc. XX, tendo vindo a provar-se mais como uma desculpa para várias operações imobilárias desastrosas. O próprio estádio Luzhniki permanece como um reduto decadente da União Soviética.


Montreal está ainda actualmente a pagar pelos erros cometidos no verão de 1976. O estádio olímpico, com uma torre cujo objectivo era o de controlar a cobertura retráctil, só ficou completo em 1987, e mesmo essa cobertura não foi possível manter devido aos ventos que assolam a região. Tudo piorou em 1991, quando uma parte da torra caiu e, mais uma vez, em 1999, quando uma área de 350 m2 simplesmente colapsou.


Londres, que será o palco da próxima edição, em 2012 já admitiu que não necessita de mais um complexo desportivo, pelo que o estádio, com capacidade para 25.000 pessoas, (seja qual for a versão) será efémero. Chicago, um candidato para 2016 pensa ir pelo mesmo caminho.

Pode ser que a tendência para os países desenvolvidos que recebem os Jogos agora seja esta: a de aproveitar os JO como um grande festival de Verão em vez de continuarem a tentar ser detentoras de novos recordes na construção. Deixem apenas os recordes que realmente interessam.


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